sábado, setembro 23, 2006

Crédito a juros fixos nos financiamentos

Em busca do crédito pré-fixado para imóveis

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, pretende, através de decisão a ser tomada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) muito em breve, abrir a possibilidade de os bancos operarem com crédito imobiliário dispensando a Taxa Referencial (TR), e cobrando taxa de juros fixa - ele informou que esta deverá ser de 12% ao ano - nos financiamentos de crédito imobiliário. Isso representaria prestações também fixas para os mutuários, dando maior segurança de que ele será capaz de honrar seus compromissos, na medida em que a TR, como indexador, desapareceria. Para os bancos, o crédito concedido em base pré-fixada contaria para efeito do cumprimento das exigibilidades.

Alguns bancos, sobretudo os estrangeiros, que captam recursos no exterior com maior facilidade e a custos mais baixos, estão demandando essa medida do governo e já há mesmo quem esteja operando nas linhas de financiamento à aquisição de imóveis com taxas fixas, mas com prazos curtos. Para a Caixa Econômica Federal (CEF), que capta recursos de poupança com base na TR mais 6% ao ano ou de TR mais 3%, no caso do FGTS, porém, não seria bom negócio dispensar a TR como indexador de seus empréstimos para não descasar ativos de passivos. Razão pela qual a medida do CMN não será impositiva. Mantega, porém, acha que também já está na hora de preparar mudanças nas regras de correção da caderneta de poupança.

A TR foi criada por ocasião do Plano Collor II, em fevereiro de 1991, como indexadora dos contratos com prazo superior a 90 dias, e para corrigir os saldos mensais da caderneta de poupança e do FGTS. Sua eliminação é um passo adicional na desindexação que ainda resta na economia brasileira.

O governo quer dar mais um impulso ao crédito em geral, reduzindo os "spreads" bancários, e nos empréstimos imobiliários em particular, principalmente porque este é um setor que tem grande espaço para crescer - pelo enorme déficit habitacional que há no país - e gerar empregos. Mesmo que a cobrança de juros fixos de 12% nominais ao ano para financiamentos de longo prazo, como são os da casa própria, ainda pareça caro, tendo em perspectiva que a economia brasileira continuará em ritmo de inflação baixa e juros em queda, o governo acredita que é uma melhor opção do que o mutuário ter sobre a cabeça a possibilidade de, um dia, a TR subir demais. Hoje a TR, fixada pelo BC, é de 0,1928% ao mês (tem variado entre 2% e 2,5% ao ano) mas, no passado, nos períodos das altas taxas de inflação, era bem maior. Normalmente, os financiamentos imobiliários cobram TR mais 12% fixos.

Medida deve acirrar a concorrência entre bancos

O crédito para a aquisição de imóveis está em expansão desde a edição de um pacote de incentivos, há um par de anos, e a intenção do ministro da Fazenda é adicionar a esse mercado a retomada de financiamentos para as incorporadoras. Esse é uma modalidade que minguou após a quebra de empresas de grande porte, como a Encol, e que agora deve ser mais simplificado e atraente para que, do lado da oferta, também haja estímulo.

A Caixa Econômica, segundo o vice-presidente da área de finanças, Fernando Nogueira da Costa, deverá chegar a um total de R$ 12 bilhões de empréstimos imobiliários este ano, com um aumento de cerca de 30% sobre os R$ 9,2 bilhões contratados em 2005. O orçamento aprovado para este ano era de R$ 10,3 bilhões, mas deverá ser revisto para cima. Ele acha que, no caso da CEF, a subtração da TR não se configura um incentivo, pois a parte mais robusta da clientela é de até cinco salários mínimos e não há escassez de demanda, mas a instituição tem procurado reduzir o custo do financiamento mexendo nos 12% fixos. A média dos empréstimos tem sido de TR mais 9,5% e, no caso recente de financiamento consignado para funcionários da Petrobras, através de um convênio com o fundo de pensão Petros, o custo baixou para TR mais 5,5% ao ano, "praticamente o que se cobra nos Estados Unidos para a aquisição de imóveis", comentou.

Se isso não faz diferença para a CEF, que opera mais com clientes da baixa renda, vem atender uma demanda dos bancos privados mais interessados em emprestar para a classe média e, nessa faixa, principalmente das instituições estrangeiras que estão acostumadas a operar com taxas pré-fixadas no resto do mundo e a ter carteiras substantivas de crédito para imóveis. Nesse caso, Costa acredita que a medida que Mantega pretende levar ao CMN é um avanço e deverá acirrar a concorrência entre os bancos.

Isso porque, com o tempo, a tendência seria dos bancos oferecerem créditos abaixo de 12% fixos ao ano e quem tomou a essa taxa antes, contratar um financiamento mais barato para pré-pagar o anterior, mais caro. Com certeza, avalia o vice-presidente da CEF, essa é uma iniciativa que, ao estabelecer um ambiente de concorrência no sistema, pode, de um lado, reduzir os "spreads" bancários, a mais recente cruzada do ministro da Fazenda.

A soma de providências - tornar facultativo o uso da TR, criar o crédito consignado imobiliário e desenvolver melhores linhas de financiamento para as empresas construtoras - resulta num leque de medidas que deve ter efeitos macroeconômicos, com impactos positivos na formação bruta de capital fixo, e micro, na medida em que pode reduzir os "spreads" bancários. Deve constar do foco do governo, ainda, medidas para reduzir os custos cartoriais, que são inflados por exigências de uma papelada que torna o custo final da transação bastante punitivo.

O governo quer ter, na construção civil, uma alavanca para sustentar taxas de crescimento econômico pelos próximos anos, como aconteceu nos Estados Unidos. Segundo Mantega, o crescimento nos últimos dois anos tem sido marcado pela expansão da oferta de crédito, à espera de maior ânimo dos empresários para que invistam em novos projetos e plantas que serão, no futuro, a âncora de taxas sustentadas de expansão da atividade econômica. Sem querer ser taxado de "keynesiano", como assinalou, o ministro entende o aumento do crédito - que ele espera que em poucos anos venha representar uns 50% do PIB - como uma importante etapa de transição até que "o espírito animal" dos empreendedores, hoje adormecido, acorde.

Fonte: Valor Online - Claudia Safatle

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